Festivais de Verão: Entre o pó dos discos e o som feito de pó

Quando o ano passado os Florence and The Machine anunciaram o cancelamento de parte da digressão que passaria por Portugal, a organização do Optimus Alive desde logo soube que tinha uma batata quente nas mãos. Quem tinha comprado o passe de três dias para o evento junto ao Tejo (quase) só por causa deles, desanimou um pouco. A coisa safaria-se com uma nova edição apetrechada capaz de fazer esquecer o infortúnio de não ter visto de perto o indie rock que a banda londrina, liderada por Florence Welsh, já nos habituou. 

Este ano a divulgação dos senhores que se seguem começou logo em Outubro. A manobra de marketing,  pronta para convencer quanto a uma crise imaginária, parece estar a beneficiar dos gigantes do rock que passarão pela Europa e que vêm dar um pulo a Lisboa. Se os Depeche Mode quase não precisavam de mais conterrâneos para fazer um chamariz em pleno (pelos menos dos jovens que hoje já estão mais perto dos 'entas'), os Kings of Leon vêm para agradar a gregos e a troianos. A fama de que são provavelmente a banda mais intermitente e conflituoso-familiar dos últimos tempos (se não contarmos com os Oasis, claro) faz com que se tenha receio que, numa outra oportunidade, já não sejam 'kings' (reis) de nada. Por outras plavras, é de aproveitar agora a boa disposição. Ao passo que se avizinha coros fortíssimos de "Use Somebody", "Pyro" ou "The End", o punk rock de Billie Joe Armstrong e Mike Dirnt (Green Day) vai transformar o Passeio Marítimo de Algés numa arena mista: os que gostam deles desde 39/Smooth (1990) ou os que ficaram presos ao American Idiot (2004).

A aura vintage do próximo dia 12 de Julho vai ficar ainda mais carregada com os britânicos Stereophonics, que trazem ainda fresquinho o oitavo álbum de estúdio, Graffiti on the Train; assim como os Vampire Weekend, que quando chegarem a Lisboa só têm o Modern Vampires of the City há cerca dois meses a ver a luz do dia ou ainda os Editors, prontos para nos explicarem (de vez) a importância do amor (The Weight of Your Love vai ser lançado no dia 1 daquele mês).

Os Two Door Cinema Club que, apesar de não serem estreantes em terras lusas e de serem uma espécie de corre-capelinhas (actuaram em Portugal em 2011 em Paredes de Coura e, no ano passado, no Festival Sudoeste), são meninos para pôr toda a gente a mexer de novo ao som dos dois discos de estúdio (pouca matéria para tantos testes ao vivo).  No mesmo dia, a Jamie N. Commons - ao qual cabe a honra do Palco Heineken - será pedido que prove porque há razão de ser no que se diz por aí de que se trata de um Tom Waits em versão miúdo; a folk electrónica dos Crystal Fighters será utilizada para ganhar mais adeptos e o americano Steve Aoki deverá trazer consigo a maior expectativa da noite. 

De Algés, os bons ventos vão soprar ainda a favor do colectivo da Califórnia, Jurassic 5, que vem preparado para fazer jus ao nome; do quarteto britânico com repentinos seguidores, Alt-J; do apuradíssimo soul de Jamie Lidell e ainda do som 'beatlelizado' de Tame Impala ou da voz sofrida no meio de um electro pop de George Lewis Jr. (Twin Shadows).

Mas antes de se rumar a uma Lisboa invadida por ingleses à procura de um lugar encantado "à beira-mar plantado", o reggae angolano dos Kussondulola vai fazer "pim pam pum" em Paços de Ferreira e o rock alternativo dos anos 80 vai sair das guitarras de Gene Loves Jezebel, em Águeda, em forma de concerto-memória no dia 11 de Julho.

Do mesmo modo, os UB40 fazem espectáculo-duplo (no Campo Pequeno, em Lisboa, a  28 de Junho) e Vila Nova de Gaia, na Praia do Areinho, no dia seguinte), cidade à qual Tricky regressa depois de ter actuado na edição do ano passado do Optimus Alive. A razão da dobradinha chama-se False Idols, o novo disco do músico de Bristol. Naquela mesma praia, enquanto o jamaicano Anthony B puxa até ao limite os sons herdados de Bob Marley e Peter Tosh, a alemã-nigeriana Ayo vai espremer os seus três discos de estúdio (o último em 2011, Billie-Eve). O seu marido Patrice, por sua vez, vai estar em Angra do Heroísmo, nos Açores.

O dia 29 de Junho é também uma data importante no calendário de Verão porque marcará  a actuação a solo de Orlando Santos, o diamante polido vindo dos Orelha Negra, no Sumol Summer Fest. Os "padrinhos" do Orlando vão também aproveitar as maresias, mas em pleno norte do país. Têm lugar marcado no palco do Festival Marés Vivas a 19 de Julho, dia em que o funk, o soul e o hip-hop da mais recente mixtape vai juntar-se à imagem  (aparentemente) masculinizada da britânica Elly Jackson (La Roux). O regresso ao passado (ou ao pó dos discos) vai ser feita através de Smashing Pumpkins e Bush no mesmo lugar, ou pelos The Killers, Arctic Monkeys, Kaiser Chiefs ou Queens of Stone Age no Super Bock Super Rock (ele há melhor sítio do que este para levantar este pó e o outro?)

E já que não há Bons Sons, em Tomar, há Músicas do Mundo, em Sines, no Algarve. A festa vai ser feita pelos repetentes malianos e quase amigos de longas temporadas de férias, Amadou & Mariam e Rokia Traoré ou pelo paquitanês Asif Ali Khan & Party. Na Zambujeira do Mar, o Festival Sudoeste vai voltar atrás no tempo e parar em 1997 com o som norte-americano dos Soldiers of Jah Army a abrir o fim-de-semana prolongado na Herdade da Casa Branca (de 8 a 11 de Agosto). O dancehall de Capleton vai ter de conviver no mesmo espaço que os feitos electrizantes de Norman Cook (Fatboy Slim); com o solo de Gnarls Barkley e ainda com o reinventado Snoop Lion (ex-Snoop Dogg) e o soul de Solange Knowles, que de tão refinado parece velho.  De volta ao Norte, Paredes de Coura (14 a 16 de Agosto), o In Our Heads (2012) vai ser o motivo de regresso de Hot Chip, banda britânica já com mais de uma década de existência; os suecos The Knife idem e os The Kills ibidem.

Mas a viagem ao interior dos baús começa já no final do mês com o Nick Cave & The Bad Seeds no Primavera Sound no Porto a 30 de Maio. Os Blur seguem-lhe os passos, assim como o californiano Daniel Johnston, o redescoberto Sixto Rodriguez ou a alternativa de My Bloody Valentine. Ah, e a culpa é do Peter Murphy. Naquele mesmo dia 30, o Coliseu de Lisboa vai ser tomado de assalto pelo post-punk dos anos 80. Vamos entrar em modo-revivalista, portanto.


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